A primeira-ministra britânica Theresa May sofreu na noite desta terça-feira uma das maiores derrotas da história do Parlamento. Por avassaladores 432 votos a 202, os parlamentares britânicos rejeitaram o acordo do Brexit negociado por longa data entre a primeira-ministra do Reino Único com os líderes da UE União Europeia.
A saída definitiva do Reino Unido da UE (União Europeia) está marcada para acontecer no dia 29/03/2019, com ou sem acordo. Obviamente, com acordo, o divórcio do Reino Unido ficaria mais organizado e relativamente tranqüilizador (ou menos traumático) para os investidores, empresários, trabalhadores e cidadãos de ambos os lados.
Entretanto, após a avassaladora derrota sofrida no Parlamento, as chances de uma saída ordenada do Reino Unido caíram significativamente, abrindo um grande leque de incerteza para as próximas semanas. May falhou enormemente, pois o Brexit, referendado, não precisava do voto de ampla maioria dos 650 deputados. Para selar o acordo de divórcio com a União Europeia, a primeira-ministra precisaria apenas de 320 votos (maioria simples dos parlamentares aptos a votar).
O escandaloso número da derrota mostra que May não conseguiu sequer agradar os membros de sua própria base de apoio. Os conservadores britânicos linha-dura anti-Europa votaram contra o acordo construído entre May e os líderes europeus, justamente porque o texto permitiria aproximação do Reino Unido com a UE mesmo após o Brexit.
Na tentativa de agradar a todos, May tentou utilizar a estratégia de um Brexit light, para colocar um pé do Reino Unido fora do bloco, porém mantendo o outro pé dentro da UE. O racional da primeira-ministra era o de prevalecer a vontade da maioria da população (pró-Brexit), mas não de uma forma economicamente dramática para ambos os lados.
Um Brexit light não levantaria barreiras comerciais automaticamente, manteria os portos abertos e impediria escassez de certos produtos. Mas, talvez, o Calcanhar de Aquiles responsável por matar o Brext light foi a inclusão do chamado backstop, que garantiria que a fronteira entre a Irlanda do Norte (território britânico) e a Irlanda (membro da UE) ficasse aberta caso um novo acordo bilateral não fosse firmado entre Reino Unido e UE até dezembro de 2020. Os norte-irlandeses e ingleses conservadores linha dura são fortemente contra o backstop, o que ajudou reforçar os votos contrários na noite desta terça-feira.
A legislação britânica determina que, com a rejeição do Parlamento, o governo tem 21 dias para anunciar um novo plano de atuação. Porém, os parlamentares haviam aprovado anteriormente uma emenda que reduziu esse prazo para apenas três dias. Na verdade, o desfecho negativo do Brexit no Parlamento, considerando o acordo atual, já era esperado. Esta emenda aprovada tem objetivo de colocar Theresa May em xeque.
A jogada foi claramente armada e denuncia que o Parlamento está enfrentando o próprio governo por disputa de poder. Este fenômeno pouco comentado ganhou força nos últimos anos, tanto em economias desenvolvidas, quanto em economias emergentes (vide casos de impeachment no Brasil, Coreia do Sul, entre outros eventos).
Cercada pela forte resistência do Parlamento, May não tem muito o que fazer durante os três dias de prazo. Pegar o primeiro avião rumo à Bruxelas na tentativa de conseguir um novo acordo de última hora parece perda de tempo, tanto porque os europeus precisam manter linha dura para que outros países membros não façam o mesmo, tanto porque os britânicos não querem saber de um Brexit light. Porém, talvez seja isso que May esteja pensando em fazer neste momento.
Terminado o prazo de três dias, o governo poderá praticamente se tornar refém do Parlamento. May pode ser forçada a renunciar ao cargo e convocar novas eleições, causando ainda mais estardalhaço para o Reino Unido e UE. O próprio Parlamento poderá tomar as rédeas do Brexit e colocar em votação cada termo do acordo em plenário. Também não está descartada a possibilidade de realização de um segundo referendo, nas mesmas condições do anterior, o que não parece fazer o menor sentido. Sem acordo nenhum, o Brexit poderá ocorrer automaticamente de forma desordenada a partir do primeiro dia de abril, com barreiras comerciais, bloqueio de portos, falta de produtos, entre outros.
Todos os desfechos imaginados a partir de um Brexit sem acordo são traumáticos e cravariam uma crise institucional no Reino Unido, onde Parlamento e governo não se entendem mais. O Partido Trabalhista convocou uma moção de desconfiança contra May, mas não tem proposta definida para os termos do Brexit. A disputa pelo poder/interesses próprios ou de certos grupos está se sobrepondo aos interesses da nação.
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