Há alguns meses circula no mercado expectativa de que a reforma de previdência, se aprovada, poderia gerar uma economia de 1 trilhão em 10 anos. Estes números são expressivos, embora a jogada numérica mostra-se mais psicológica do que algo factível.
Economizar 1 trilhão em 10 anos é algo de fácil entendimento. É basicamente o que o Brasil precisa fazer para sair de uma situação de insolvência fiscal no futuro. A combinação de números (1 trilhão com 10 anos) também facilita a memória e fixa facilmente na mente do investidor.
A jogada numérica pegou fácil no mercado, o que pode estar criando expectativa exageradamente positiva por parte dos investidores/operadores. Mesmo considerando que algum tipo de reforma da previdência seja aprovado neste ano, dificilmente conseguiríamos alcançar economia de 1 trilhão em 10 anos.
Em primeiro lugar é importante realizar um diagnóstico de nossa situação atual. Já são 5 anos consecutivos que o Brasil não consegue gerar superávit primário, termo que, por sinal, corre risco de extinção. São 5 longos anos sem um mísero centavo de economia e grandes pulos de cabeça no cheque especial. São 5 anos de cobranças de analistas, economistas, investidores e empresários para melhoria nas contas públicas. Durante esse período, tivemos governos centro-esquerda e centro-direita. Passamos por experimentos ortodoxos e heterodoxos. A parte da ortodoxia bateu no muro do Congresso, ao contrário da heterodoxia que passou desfilando como escola de samba em plena Sapucaí.
Para 2019, com ou sem aprovação da reforma da previdência, a expectativa é que o Brasil vai fechar as contas novamente no vermelho, ao redor de “apenas” 100 bilhões de reais, caso o governo não consiga tirar nenhum coelho da cartola para suavizar o déficit fiscal imediatamente. O coelho até existe (aumento de impostos), mas Paulo Guedes não parece ter autorização, por enquanto, para retirá-lo.
Caso confirmado, o déficit fiscal de 2019 será o sexto consecutivo. Se já está difícil zerar um déficit de centenas de bilhões de reais que se prolonga há mais de cinco anos, o que dirá economizar 1 trilhão em 10 anos.
Para a previdência assumir, sozinha, esta economia de 1 trilhão em 10 anos, Paulo Guedes teria de convencer os parlamentares esquecerem suas respectivas carreiras políticas e buscarem realocação profissional em outras áreas/segmentos, pois haveria forte reprovação popular.
A parcela da população favorável à reforma da previdência dura (como precisa ser para alcançar 1 trilhão em 10 anos) é pequena, formada, basicamente, por cidadãos que já possuem suas próprias previdências privadas/carteira de investimentos ou um mínimo planejamento para o futuro. A parcela da população que não poupa ou não se planejou para o futuro obviamente vai continuar torcendo por uma aposentadoria precoce, como ocorre atualmente, não por desejo de parar de trabalhar, mas sim para “garantir” o recebimento de uma quantia mínima num futuro próximo. É uma espécie de hedge do desemprego. No pior cenário para o cidadão (perda da renda do trabalho) a previdência pública garantiria o seu sustento.
Quando o assunto está relacionado às contas públicas, nosso histórico é fortemente negativo. Atualmente, o orçamento está quase todo engessado, o que inviabiliza a prática da tesourada. Ou seja, para cortar gastos, será necessário aval do Congresso para mudanças em vários pontos crucias na Constituição. A outra forma pouco comentada de prática de uma bela tesourada seria enfrentar o lobby de algumas empresas/setores, o que em outras palavras significa acabar com uma penca de benefícios ineficientes. A era Dilma II e Temer mostrou como é difícil enfrentar o lobby e o Congresso, não por acaso o endividamento se aproxima de 80% PIB.
Para se ter uma ideia da velocidade do agravamento das contas públicas, a reforma da previdência proposta pelo governo Temer já é considerada insuficiente ou obsoleta. O que foi arquitetado dois/três anos atrás não serve mais para colocar as contas em dia em função do aumento do rombo fiscal.
Isso significa que Paulo Guedes precisa convencer o Congresso aprovar uma reforma da previdência mais dura do que aquela que se aventava no governo anterior. A necessidade de uma reforma mais impactante nada mais é do que o famoso efeito financeiro da bola de neve.
Estamos acumulando déficit primário superior a 100 bilhões de reais (ou 1,5% PIB) desde 2015. Não é uma situação ocasional/esporádica, mas sim um perigoso padrão de rombos sucessivos. Esse paradigma precisa ser quebrado imediatamente e substituído por uma sequência ininterrupta de superávits primários de 1,5% PIB durante os próximos 10 anos. Em outras palavras, considerando que o brasileiro entende mais de futebol do que de finanças, alcançar esta façanha será mais difícil do que ganhar a Copa do Mundo, com ou sem Neymar, e mesmo que o rival seja a Argentina.
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