Não há como negar o mérito da cartada do FED (Federal Reserve – Banco Central dos Estados Unidos) apresentada ao mundo inteiro na reunião do Comitê de política monetária realizada em dezembro/2018. Na época, o mercado global estava em pânico e os ativos de risco acumulavam perdas expressivas. Algumas praças financeiras operavam, inclusive, em bear market.
Wall Street estava muito perto de sinalizar virada técnica para um mercado bearish quando o Banco Central norte-americano entrou em ação para acalmar a tensão no mercado. A política monetária foi estrategicamente recalibrada para um viés mais dovish através da redução da expectativa de juro neutro (patamar que mantém a economia em crescimento sem criar pressão inflacionária) para 2,8%, nível mais baixo do que o esperado anteriormente e levemente inferior da red line de 3% ao ano.
Além disso, as novas previsões do FED apontaram, em dezembro/2018, que a FFR (Federal Funds Rate – taxa básica de juros norte-americana) deverá passar apenas por duas elevações de 0,25 p.p. neste ano, ao contrário de três altas projetadas anteriormente.
As revisões foram importantes para acalmar a tensão criada na época em relação à política monetária do FED, que estaria, na avaliação de alguns economistas, analistas e, também, do presidente Donald Trump, mais apertada do que deveria. O FED abaixou a guarda e passou a projetar um cenário de juros mais baixos, talvez não somente para minimizar a pressão, mas principalmente para trucar o mercado em pânico.
Observando os deslocamentos nos preços dos ativos de risco desde então, pode-se concluir sem sombra de dúvidas que o FED acertou em cheio na tentativa de domesticar o mercado. A estratégia implementada foi um sucesso.
O fluxo tem sido fortemente comprador no mercado de juros futuros, câmbio e bolsa. O S&P500 é negociado aos 2.681 pontos, bem acima da mínima de 2.350 pontos registrada em dezembro de 2018. A taxa de juros da Treasury de 10 anos (título do tesouro norte-americano) caiu de 3,25% para 2,70%. As demais praças financeiras mundiais também operam em trajetória semelhante, com diferença apenas na intensidade do movimento comprador.
Observando o sucesso no mercado financeiro desde a última reunião realizada em dezembro do ano passado, o FED não somente manteve a aposta, como redobrou o viés. O mercado quer cautela, flexibilidade, menos juros e dinheiro na mesa. A reunião do Comitê de Política Monetária do Banco Central dos Estados Unidos, encerrada nesta última quarta-feira, mostrou que, por enquanto, é assim que vão continuar agindo.
Além de manter a FFR inalterada no intervalo entre 2,25% a 2,50% ao ano, o Banco Central dos Estados Unidos aumentou ainda mais o viés dovish da política monetária ao mencionar em ata que pretende ser mais paciente antes de realizar novas elevações na taxa básica de juros.
A mudança na comunicação é significativa, pois sinaliza que o ciclo de aperto monetário pode estar se aproximando do fim e, talvez, a FFR nem vá alcançar o nível de aproximadamente 3% ao ano. Até então, o mercado trabalhava com duas elevações de 0,25 p.p. este ano, expectativa que, por sinal, já tinha sido revisada para baixo em dezembro do ano passado (de três altas de 0,25 p.p. esperadas para 2019 para apenas duas).
Em entrevista concedida à imprensa após a reunião de Comitê, Powell reforçou a nova mensagem da autoridade monetária ao confirmar que a argumentação para um aumento dos juros se enfraqueceu. Isso significa que, a princípio, não há mais expectativa para o FED voltar a subir a FFR.
A mão super dovish do FED foi ainda mais surpreendente sobre a estratégia de desalavancagem, em curso, de seu balanço. Antes do crash de 2008 o FED operava com balanço saudável de pouco menos de 1 trilhão de dólares em títulos. Atualmente, o balanço do FED gira em torno de 4 trilhões de dólares, após alcançar pico em 4,5 trilhões de dólares no auge dos programas de estímulos monetários (Quantitative Easing e Operação Twist). Isso significa que, teoricamente, havia gordura de cerca de 3 trilhões para ser queimada no balanço, voltando a colocá-lo nos níveis de pré-crise subprime.
Entretanto, algo mudou na avaliação dos membros do Comitê nestas últimas semanas. Já que o mercado está suportando taxas de juros bem mais baixas do que os padrões históricos, talvez o mesmo raciocínio possa ser aplicado para permitir que o balanço possa ser operado em níveis bem mais elevados do que os padrões históricos.
A tentação do FED em não reduzir seu balanço significativamente talvez possa ser explicada pelo fato de o mercado, até hoje, não ter se importado com os trilhões em títulos hipotecários e do Tesouro norte-americano mofados em seu cofre.
Reforça essa postura dovish o fato de a inflação, temida por economistas da escola austríaca há vários anos, sequer demonstrar sinais de rompimento do centro da meta de 2%. Pelo contrário, as projeções apontam para uma nova onda de desaceleração da inflação nos próximos meses, desafiando, há tempos, velhas teses econômicas.
Ciente do vício dovish do mercado, e com os dados do experimento de dezembro apontando para um sucesso na estratégia, o FED está aumentando sua aposta para manter o mercado sob controle. O Banco Central dos Estados Unidos confirmou que está preparando ajuste em seu plano de desalavancagem, sinalizando que seu balanço vai operar muito acima dos níveis observados em 2008.
Alguns analistas já começam a projetar que apesar de o balanço do FED continuar reduzindo durante este ano, deverá estacionar na região demarcada pelo circulo vermelho no gráfico acima, ao redor de 3,5 trilhões de dólares. Dinheiro na mesa e juros na lona. É isso que o mercado quer, é isso que o FED entrega.
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