Ao mesmo tempo que vivemos em um cenário de crescentes mudanças na economia brasileira, aumentam-se as dúvidas em relação à alocação de produtos financeiros entres os investidores brasileiros.
Como forma de melhor compreender esse momento e os seguintes que virão, bem como traçar a estratégia mais eficiente ante este cenário, é necessário recordar brevemente alguns acontecimentos em nossa economia.
O histórico do mercado de capitais brasileiro foi marcado nas últimas décadas por forte volatilidade e instabilidade monetária. Passados os períodos de hiperinflação da década de 80 e começo de 90, o Brasil implantou o Plano Real, que estabilizou os preços e iniciou o caminho para um futuro de equilíbrio macroeconômico.
Uma das estratégias para a implantação da nova moeda foi indexá-la de acordo com a taxa de câmbio. O que vimos é que, na prática, o dólar se tornaria o novo indexador da nossa economia. Essa estratégia tinha um preço alto, era necessário atrair capital estrangeiro e recursos para as contas de Capital e Financeira do Governo. Para isso acontecer, nesse período, o valor da SELIC chegou a ser de assustadores 170% ao ano, um valor irreal para qualquer economia mundial conseguir rolar suas dívidas. Uma vez criada a âncora cambial e controlado o nível de preços, o valor da taxa básica de juros veio caindo rapidamente, seguindo os passos da inflação.
Mesmo diante do novo cenário de estabilização monetária, a economia brasileira precisou conviver com a Selic acima de 25% por mais de uma década. O Banco Central só conseguiu reduzir a taxa para menos de 2 dígitos, de maneira consolidada e sustentável, depois de 25 anos.
Em um próximo post, iremos adentrar em como esses fatores influenciaram todo mercado de capitais brasileiro e a alocação de recursos dos investidores nacionais. Por hora, vamos nos ater à análise desses desdobramentos para os Títulos da Dívida Pública Brasileira, conhecidos como Tesouro Direto.
O Tesouro Direto é considerado uma opção de investimento barata e segura, são os ativos com menor risco em uma economia. Podemos dividí-los em 3 principais grupos:
- Indexados à inflação (pós-fixados);
- Pré-fixados; e
- Indexados à taxa Selic.
A variação, rentabilidade e as principais características desses títulos podem ser observadas por alguns parâmetros: Valor Unitário (Preço), Cupom (Juros, taxa de rendimento) e a Duration (cálculo de vencimento a valor presente).
Fonte: Site do Tesouro Direto.
Os investimentos em títulos públicos podem ser caracterizados como renda fixa ou renda variável, dependendo da estratégia adotada pelo investidor. A fim de facilitarmos o entendimento do funcionamento dessa dupla identidade dos ativos, podemos realizar uma analogia para a melhor compreensão do investidor não profissional.
Levemos em consideração que o investimento em Tesouro Direto seja como um contrato com o Governo. Caso esse contrato seja exercido até o seu final (vencimento), você saberá quanto ele irá lhe pagar, seja por taxa pré-fixada em “contrato” ou por algum indexador, como a inflação ou a taxa Selic. Porém, o que a maioria dos investidores pessoa física (e a maioria dos gerentes de banco) não sabem é que, caso esse contrato seja “quebrado”, ou seja, caso o investidor deseje resgatar esse título antes de seu vencimento, a rentabilidade do tesouro funciona, na prática, como renda variável, com volatilidades menores que ativos negociados em bolsa, mas podendo ter alta volatilidade dependendo do cenário econômico. O que rentabiliza o investidor quando o contrato é quebrado é a relação entre preço do ativo e a taxa de juros daquele título, o valor de face (preço do ativo) é inversamente proporcional ao comportamento da variação da curva de juros.
Mas, afinal de contas, como se investe no Tesouro Direto de maneira ativa?
Quando você investe em renda fixa, é normal pensar que, à medida que os juros vão subindo, seu investimento irá rentabilizar de maneira positiva e isso se tornaria um bom investimento. Afinal de contas, o CDI, a Selic, ou mesmo a inflação estão em um cenário de apreciação. Porém, a lógica do Tesouro Direto é inversa. Caso você deseje resgatar esse título (vendê-lo antes de seu vencimento), a rentabilidade recebida será inversamente proporcional à trajetória dos juros embutidos naquele ativo.
Diante disso, podemos concluir que o melhor cenário para investir em Títulos Públicos é quando a expectativa é que a curva de juros futuros irá cair.
Esta estratégia se configura como a melhor para essa categoria de investimentos por dois motivos:
1) Ao investir em um momento em que os juros estão altos, você está protegendo seu capital no mais seguro dos investimentos financeiros no Brasil, e ainda tem ganhos reais com bom retorno quando comparado a demais investimentos em renda fixa.
2) Quando a expectativa futura é de que os juros caiam, você está comprando a opção de “quebrar o contrato” (revender o título no mercado) com o Tesouro Nacional antes do prazo acordado.
Como vimos anteriormente, o preço dos títulos varia de maneira inversamente proporcional às taxas que o remuneram e essas taxas variam de acordo com os juros futuros. Sendo assim, enquanto a taxa de juros mantém a trajetória de baixa, o valor de face do seu título (preço pago na compra) vai se valorizando. Portanto, a remuneração que você irá obter pela venda no mercado desse ativo, antes do prazo determinado na compra, será muito maior do que a própria taxa que o remunera.
Para ilustrar essa lógica podemos usar o seguinte exemplo real: No primeiro semestre de 2016, o país e o mercado viviam a expectativa pelo andamento do processo de Impeachment da então presidente Dilma. Durante esse semestre, os indicadores do mercado de capitais brasileiro estavam sofrendo alta volatilidade. O dólar estava sendo comercializado acima de 4 reais, a inflação estava alta como reflexo desse aumento do dólar, somados ao choque negativo de produção de alguns alimentos (problemas climáticos) e aumento de preços de energia que haviam sido controlados pelo Governo durante a campanha para eleição de 2014.
Era um cenário de risco político e econômico que refletiam diretamente no valor das taxas de juros.
Nesse período, haviam títulos pré fixados que pagavam rentabilidade acima de 16% ao ano, como por exemplo, a LTN para 2023. Seu preço era negociado, no início de 2016, a R$ 346 e a taxa fixa paga era de 16,59% ao ano.
O cenário que se configurou adiante foi: Um novo presidente tomando posse, onde embora a economia ainda estivesse sofrendo muito, o Ministério da Fazenda e o Banco Central sinalizavam uma política econômica mais liberal, e a taxa de câmbio recuou rapidamente com a inflação seguindo o mesmo caminho.
Como esses são alguns dos aspectos que mais influenciam a política monetária brasileira (Inflação, câmbio, credibilidade do Banco Central, estabilidade política…), as taxas de juros futuras e a Selic vieram caindo sucessivamente com algumas variações pontuais até o momento em que vivemos hoje. Podemos ver, na imagem a seguir, o que aconteceu desde então com a trajetória das taxas de juros e do preço do título que abordamos anteriormente, a LTN 2023 Pré-fixada.
É nítido o comportamento inversamente proporcional entre os dois principais aspectos que rentabilizam o título, à medida que as taxas de juros vieram caindo o valor do título sofreu expansão. Podemos realizar uma simples análise para entender porque o preço do título valorizou ao longo do tempo. Caso você quisesse comprar um investimento hoje, para o ter até 2023, você optaria por um que pagasse 16,59% (o que pagava em 2016) ou 6,26% (o que o mesmo título paga hoje em dia). A obviedade da resposta é a mesma que explica o comportamento do preço do título, o mercado ajusta automaticamente esse preço para que o prêmio do título seja proporcional ao valor que era “acordado em contrato” na data da compra.
Na prática, esse título é muito melhor que os disponíveis hoje no mercado, portanto, apreciou-se durante esse período. Mais precisamente, seu preço subiu para R$ 808,72 enquanto escrevia esse texto, o que significa incríveis 234% de valorização em 3,5 anos caso o investidor quisesse vender esse Título no mercado, “quebrando” o contrato que estabeleceu no momento da compra.
Esse comportamento citado responde uma dúvida de muitos investidores: Tesouro Direto é Renda Fixa? Na verdade, sim e não. Depende da forma como você for administrar seu Investimento. Conforme vimos, no curto prazo, é variável de acordo com as taxas de juros e preço dos títulos. No longo prazo é renda fixa, conforme rentabilidade estabelecida na data da compra.
É um bom momento para comprar Tesouro Direto?
Essa resposta sempre irá depender do objetivo da sua estratégia, caso você opte por um investimento com baixíssimo risco e retorno pré estabelecido para o longo prazo, sim. Mas se sua opção for investir de maneira ativa, querendo rentabilizar os títulos no curto prazo para uma revenda a valor de mercado (como vimos no exemplo real anterior), pode não ser. Para responder essa pergunta de maneira satisfatória e mais assertiva, o investidor precisará analisar nossa economia. O momento atual do mercado de capitais brasileiro é incomum para nosso país, sobretudo pelo comportamento da taxa de juros.
A Selic se encontra em seu menor patamar histórico, administrada em 6,5% ao ano desde março de 2018. A inflação, principal indicador que influencia o comportamento da taxa básica de juros no Brasil, encontra-se em 2,23% em 2019 e em 3,37% no acumulado dos últimos 12 meses, refletindo o ainda ruim momento da economia brasileira do ponto de vista de investimento e consumo, permitindo a possibilidade de um novo corte por parte do COPOM.
Todo esse cenário cria uma situação onde parte considerável do mercado já precificou uma nova queda da taxa para essa semana (O Comitê de Política Monetária do Banco Central se reúne a partir da próxima 3ª feira, para debater um possível corte da taxa básica de juros) e essa “precificação” fica evidente quando você analisa o comportamento das taxas de juros futuras, que caíram fortemente diante dos últimos comunicados do COPOM e dos positivos desdobramentos da reforma da previdência.
Estamos diante de um cenário de quase unanimidade do mercado para probabilidade de corte nas taxas, que vieram aumentando o preço (valor de face) dos Títulos Públicos. Estamos vivendo no menor patamar da Selic, que não permite cortes da mesma proporção que aconteceram entre 2016 e 2019. Mas o que ocorreria com a rentabilidade dos títulos caso não ocorresse esse provável corte, ou se invertêssemos a trajetória de queda para os próximos anos? A resposta é: a expectativa seria corrigida pelo fato e, provavelmente, teríamos um aumento dos juros futuros, consequentemente derrubando o preço de venda dos ativos no curto prazo.
Essa deve ser então a estratégia que o investidor pode desenhar ao se posicionar em títulos públicos em curto prazo. Analisar o comportamento do título desejado para os próximos dias/meses/anos, dependendo do objetivo da compra e dos desdobramentos econômicos.
Quando um Gerente de Banco ou Assessor de Investimentos recomenda a compra de um título público (algo comum nesse momento do mercado) sem analisar o comportamento da curva de juros futuros, na verdade, ele poderá estar distribuindo um produto de alta volatilidade e risco de perda do capital do cliente, caso este precise de liquidez no curto prazo.
Isso pode acontecer por desconhecimento dessa dupla identidade dos Títulos Públicos. Portanto, caso hoje você possua títulos do Governo pode ser um bom momento para vendê-los antes do vencimento do título, pois na grande maioria dos casos ele estará rentabilizando mais pela revenda a valor de face, do que pela própria taxa de remuneração, acordada previamente em “contrato”.
Para os interessados em negociar Tesouro Direto e saber se esse momento é realmente bom, o ideal é buscar assessoria de um economista ou especialista em investimentos que analise suas demandas e crie a melhor estratégia de acordo com seus objetivos.
Em um próximo post, analisaremos quais fatores poderiam inverter a atual expectativa no rumo da trajetória da taxa de juros, e quais investimentos seriam melhores opções no curto e longo prazo.
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