O Brasil deve reforçar seus vínculos com o Ocidente em detrimento das relações com a China?
Não.
Durante a aula magna de 2019 para os novos alunos do Instituto Rio Branco em Brasília, as relações diplomáticas entre Brasil e China foram um dos tópicos comentados pelo Ministro da Relações Exteriores Ernesto Araújo. “Queremos vender, por exemplo, soja e minério de ferro, mas nós não vamos vender a nossa alma. Isso é um princípio claro que temos muito presente”, afirmou categoricamente.
Com essa forte declaração, fica clara a queda de braço dentro da política externa do governo Bolsonaro entre a ala ideológica anti-globalista, ligada principalmente ao Chanceler Ernesto Araújo, ao deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) e a influente figura do filósofo Olavo de Carvalho, que enxergam a China como uma ameaça estratégica para o seu plano espiritual de resgate dos valores ocidentais, e outra mais pragmática, que inclui a bancada ruralista no Congresso Nacional, o núcleo militar e Paulo Guedes e sua equipe econômica.
Apesar de reiterar o objetivo do Brasil de se aproximar dos Estados Unidos e se alinhar ao país comercialmente e geopoliticamente, Guedes deixou claro em entrevista recente em território americano que o Brasil deve continuar fazendo comércio com a China ao mesmo tempo que reforça os seus vínculos com o ocidente. Esse posicionamento vai de encontro a comentários do vicepresidente Hamilton Mourão e da Frente Parlamentar Agropecuária (FPA), que não escondem a sua preocupação com os atritos gerados pelas seguidas declarações anti-china feitas por membros do atual governo e do próprio presidente Jair Bolsonaro.
Os Estados Unidos vêm recentemente pressionando diversos países do mundo a reduzir sua exposição à China e a sua agressiva política de expansão de influência econômica e cultural. Autoridades americanas já levantaram o assunto com o governo brasileiro e não escondem a sua preocupação com o avanço chinês na américa latina. Porém, do ponto de vista prático e estratégico, entrar neste barco é um péssimo negócio para o Brasil.
O gigante asiático é o principal parceiro de negócios do Brasil há mais de dez anos, absorvendo 36% das exportações do agronegócio brasileiro, sendo responsável pela maior parte dos investimentos diretos internacionais recebidos pelo país e gerando um superávit de mais de US$ 32 bilhões na nossa balança comercial. Com isso, mesmo as surpreendentes concessões conseguidas pelo presidente Bolsonaro durante a sua viagem a Washington e as perspectivas de avanços na relação bilateral entre os dois países não justificam qualquer inclinação de afastamento diplomático com Pequim.
Desde o possível apoio à candidatura brasileira a OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) anunciado por Donald Trump até os acordos de cooperação militar prospectados, o estreitamento das relações com os Estados Unidos e seus aliados ocidentais pode sim gerar bons frutos. Entretanto, o governo americano exigiu um preço alto em troca dos benefícios cedidos e também não consegue oferecer qualquer possibilidade de absorver o fluxo da nossa pauta de exportação hoje direcionada à China e de suprir investimentos em nossa infraestrutura em caso de diminuição das trocas entre os dois países.
Assim, independentemente dos avanços tangíveis com uma aproximação ao primeiro mundo trumpista, o Brasil continuará precisando contar com o apetite chinês pelas nossas principais commodities, soja e minério de ferro, para gerar empregos e crescimento, uma vez que toda a nossa matriz econômica depende em grande parte dos ciclos desses produtos.
A estratégia de aproximação automática aos Estados Unidos guiada principalmente por alinhamentos ideológicos proposta por Araújo foge da tradição histórica do Itamaraty e entrega pouquíssimos resultados concretos. Tendo o desenvolvimento nacional como principal objetivo da nossa política externa, não podemos comprar briga com nosso principal parceiro econômico internacional.
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