Quem ainda não sentiu calafrio com o inverno que se aproxima, poderá sentir agora um arrepio gelado com a notícia de que Brasil e Argentina estudam adotar união monetária.
Durante visita à Argentina, Jair Bolsonaro disse aos repórteres, na última quinta-feira à noite, que o ministro da Economia, Paulo Guedes, deu o primeiro passo para um sonho de uma moeda única na região do Mercosul, o “peso real”. Logo depois, o Ministério das Finanças da Argentina confirmou a informação do presidente brasileiro, afirmando que existem negociações para união monetária entre os dois países no médio/longo prazo.
A proposta de união monetária poderá se expandir também para Paraguai e Uruguai, dois outros integrantes do Mercosul. O fato de a eventual moeda única possuir até um nome pré-selecionado (peso real) pode deixar alguns investidores estarrecidos. Como um assunto tão delicado surgiu de uma forma aparentemente tão rápida e simples? E mais, desde quando unificar moeda com los hermanos é um sonho para nós, brasileiros, acostumados assistir de camarote a sequência de desastres econômicos do nosso vizinho?
União monetária não é como dar nome a um filhote de cachorro, é algo extremamente ousado, o que implica em responsabilidades significativamente maiores do que as nossas próprias que mal conseguimos administrar.
Entretanto, o receio da notícia foi parcialmente quebrado com uma nota do Banco Central do Brasil na manhã desta sexta-feira, informando que não há projetos nem estudos em andamento para uma união monetária entre Brasil e Argentina. O Banco Central confirmou apenas que existem diálogos sobre a estabilidade macroeconômica na região.
Infelizmente o alívio da nota do Banco Central durou pouco, pois na tarde desta sexta-feira as especulações ganharam força e o próprio presidente Jair Bolsonaro reafirmou que Brasil e Argentina podem criar uma moeda única, que futuramente pode incluir toda a América do Sul. Quanto mais fala, pior fica.
Obviamente existe potencial no Mercosul, mas não a ponto de nos arriscarmos numa aventura de moeda única. Até na parte comercial, objetivo central do bloco, ainda não é possível notar a eficácia que se espera de parceiros comerciais. O Mercosul ainda é uma promessa de bons negócios para o futuro, assim como a América Latina é uma promessa de região próspera para o futuro. A história sul-americana é marcada por incontáveis dificuldades de ultrapassar as barreiras das promessas, ou daquilo que se espera de uma região com todas as condições técnicas para prosperar.
Além do histórico desfavorável, o momento não é nem um pouco adequado para sequer pensar em qualquer medida relacionada à aproximação com o peso argentino. Não faz nem um ano que a Argentina sofreu um duro ataque do mercado, por conta de sua longa lista de problemas domésticos não resolvidos, piorando cada vez mais.
Com as reservas internacionais baixas demais, em setembro do ano passado os investidores passaram a temer um novo calote do governo argentino sobre os títulos da dívida soberana, o que provocou pânico no mercado e derrubou o peso argentino para 40,00 dólares, muito acima da média de 16,00/17,00 dólares predominante entre 2016 e 2017.

Apesar dos poucos comentários na imprensa sobre a crise na Argentina, a moeda local segue numa situação pior da que foi constatada em setembro do ano passado, considerado o auge da crise. Hoje, o peso argentino é negociado a 44,80 dólares, uma das piores cotações da história.
O governo argentino teve que pedir socorro urgente ao FMI (Fundo Monetário Internacional) para conseguir honrar os compromissos deste ano. A linha de financiamento concedida foi de 50 bilhões de dólares, com liberações parciais. No entanto, mesmo com ajuda do FMI, a Argentina continua em situação muito delicada.
Como de costume, a economia está em recessão e o desemprego segue elevado. A taxa básica de juros é de estratosféricos 70,28% ao ano, mas ainda assim o BCRA (Banco Central da República da Argentina) não consegue controlar a inflação, que renovou mais um recorde no mês de abril, alcançando 55,80% no acumulado dos últimos 12 meses.
O cenário fiscal é outro desastre que merece um capítulo a parte. A dívida pública da Argentina saltou para 86,2% PIB, o que combinado com os juros altos, excesso de endividamento em moeda estrangeira e baixo nível de reservas internacionais, não é tão difícil imaginar mais um desfecho traumático para o país. Afinal de contas, um calote a mais ou a menos não faz muita diferença para a história da Argentina.
Se não estamos dando conta de nossos próprios problemas, pior ainda assumir todas essas encrencas dos hermanos. Talvez seja melhor ficarmos na rivalidade do futebol.
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